quarta-feira, 2 de março de 2011

O Nosso Belo Quadro Social


E você acredita que é um doutor, padre ou policial que está contribuindo para o nosso belo quadro social. (Raul Seixas)


A música “Ouro de Tolo”, de Raul Seixas, apesar de simples, chega a ser intrigante. Alguns optam por acreditar que nela Raul estava fazendo uma crítica aos burgueses infelizes de sua época, outros que ele estava se colocando na música, expressando sua própria verdade. Ela me seduz porque representou claramente uma fase da minha vida em que eu “devia estar contente porque tinha um bom emprego e era um dito cidadão respeitado, mas um sujeito chato que não achava nada engraçado e achava tudo um saco”. Ela me convidou a nunca mais obter “ouro de tolos”. Enquanto eu tentei viver os sonhos que não eram meus eu me consumia com revoltas a cada dia pelos absurdos que via.

Após ler o livro “A Cabana” comecei a entender algumas coisas de outras formas e minha revolta contra todo tipo de instituição somente ganhou força. Através do livro reconheci como a instituição é opressora, má, egoísta e formadora de assassinos. Elas, as instituições, são criadas pelos homens para visarem tudo, exceto o homem. É incrível como conseguimos construir a própria destruição. A instituição está sempre colocando o homem em segundo plano, apenas ela e seu crescimento em evidência. Ela condiciona a homens e mulheres a morrerem por ela, a se matarem a fim de serem seus protagonistas. Dos funcionários mais oprimidos aos chefes mais opressores, todos querem engolir uns aos outros, na tentativa de serem superiores a um, que seja (quanta baixa auto estima e ambição exacerbadas). Isto me lembra muito os ideais do Manifesto do Partido Comunista, que para mim nada mais são do que expressões do desejo do proletariado em tornar-se burguesia e ver os antigos opressores oprimidos pelos reprimidos novos opressores.

O que me incomoda não
é o grito dos maus,
mas o silêncio dos bons.
(Martin Luther King)
Bem, nisto tudo, se há alguém ganhando vantagem em tudo, há alguém se fu*** sendo prejudicado em tudo isto. As pessoas oprimidas pelos diversos sistemas (religiosos, políticos, sociais, familiares etc) ficam marginalizadas, sujeitadas aos recursos de sobrevivência dos marginalizados: lixões, furtos, trabalho infantil, trabalho escravo (com esmolas chamadas de salário), prostituição, mendigagem e outros atos que os tornam desprezíveis ante a “sociedade bem sucedida” que vive “assentada no trono de um apartamento com a boca escancarada, cheia de dentes, esperando a morte chegar”. Os sonhos destes marginalizados (posto às margens da sociedade) são minados, aliás, eles não costumam ter sonhos, a realidade deles costuma impossibilitar seus os sonhos.

Tornamo-nos excludentes em coisas aparentemente simples, como quando, por exemplo, criamos aqueles pequenos grupos fechados de futebol que não se abrem aos magrelos ou balofos meninos “penas de pau”. Ainda quando criamos aquela tribo de amigos que pensam, vestem-se e falam iguais, fechando-se ao mundo composto pelas demais pessoas caretas da terra. E quando temos aquele grupo filosófico, ideológico ou religioso que simplesmente se considera superior aos que não são dele.

Isto tudo parece até a ressurreição do movimento hippie e seus ideais ou ainda dos bons e não utópicos defensores dos direitos humanos (em extinção), daqueles que lutam pelas pessoas desfavorecidas e oprimidas pelos diversos sistemas. Ave Tiradentes!

Eu costumo espalhar frases pela minha casa e na geladeira se encontram as melhores, uma delas diz: para você se dar bem injustamente, alguém tem que ser injustiçado. Acho que esta forma de egoísmo pode nos ajudar e pensar um pouco melhor antes de fazermos aos outros tudo que não gostaríamos que fizessem com a gente (e isto não é egoísmo?). Enquanto a humanidade não tomar consciência disto – e temo que não aconteça – seremos todos “médicos, padres ou policiais que acreditam estar contribuindo para o nosso belo quadro social”!


CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL
PREÂMBULO


Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL.

*Publicada no Diário Oficial da União nº 191-A, de 5 de outubro de 1988.

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