sexta-feira, 22 de abril de 2011

Sua Morte pela minha Liberdade

Muitos morrendo pela liberdade de tantos... 

Eu já estive bem mais próximo da data que se comemora hoje, a morte de Jesus de Nazaré, o deus cristão. Já estive nos púlpitos protestante e nos círculos de orações que interpelavam pelas almas que não  compreendiam o real significado da morte do nazareno: a salvação. Eu ainda creio na salvação espiritual. Acredito que o espírito deve ser salvo "da prisão que tira sua liberdade". Esta liberdade é integral; ela é física, intelectual, espiritual e social. Ela inclui a plebe e a coroa, sãos e leprosos.  

Sócrates antes de tomar chá de Cicuta, planta venenosa.
Seguindo a uma ordem cronológica, neste dia minha mente é arremessada, primeiramente, há aproximadamente 2400 anos, onde em favor da liberdade da mente foi morto nosso Sócrates (platônico ou não). Aquele que andava pelas ruas de Atenas desviando os jovens - da ignorância para a sabedoria (esta era a subversão de Sócrates) - foi condenado à morte por envenenamento. Em uma sociedade manipuladora e de pensamento cativo, a mente de Sócrates tornou-se uma Caixa de Pandora. Aliás, em todas as épocas, ela sempre foi encontrada em coisas ou pessoas. Mas Sócrates não estava triste ante sua morte, para ele a morte era a libertação de uma doença chamada vida,  portanto, à Asclépio, o deus da Medicina, devia-se um sacrifício. Enquanto todos choravam sobre seu leito, Sócrates, o obcecado pela libertação da alma através da filosofia, sempre irônico e maiêutico (concepção das idéias através da dúvida), dizia: devo um galo a Asclépio; pagai a minha dívida. Seus jovens, "cavalos de asas restauradas", estavam tristes , porém libertos. Viam pouco a pouco, gole a gole a morte daquele que os amara


Segundo a tradição cristã, pouco mais de 400 anos depois de Sócrates estava morta a nova "Caixa de Pandora", Jesus de Nazaré, o anátema de religiosos e políticos. Este (cristão ou não) pode ser considerado o homem mais popular de todas as épocas. Também morreu pela liberdade. O sacrifício de Jesus, para mim, representa a libertação do espírito. Diz a Sacra Scriptura que o próprio Jesus defendia uma alma livre, não acorrentada e destinada à condenação eterna. Para Jesus esta liberdade era alcançada através do conhecimento da verdade. Segui-lo não era fácil, aqueles que o fizessem poderiam até terminar como ele, mas com certeza teriam menos fardos do que aqueles que escolheram viver aprisionados e não passaram pelo novo nascimento - a alma, antes morta, renasceria através da libertação do espírito, o conhecimento da verdade. Seu espírito era livre e, onde estivesse, haveria liberdade. Mesmo após sua morte, onde seus discípulos estivessem em seu nome, ali ele estaria e a salvação continuaria. Na história de Jesus a morte nunca foi uma vilã, apenas um meio para cumprimento de um fim maior. Em suas últimas palavras apenas a necessidade do corpo (água) e da alma (perdão), e, por fim, a legitimação de sua missão, tudo estava consumado.

Alguns dispensam a imagem de Tiradentes
cabeludo e barbudo, pois ele era
um ex militar e, em prisão, cortavam
as barbas e cabelos dos presos
para evitarem-se parasitas
e doenças contagiosas.

E não muito distante de nós e de uma realidade mais palpável a nós, está ele, Joaquim José da Silva Xavier, o famoso Tiradentes. Ex alferes ( militar que hoje corresponderia à primeira patente oficial das forças armadas) que lutou pela independência de seu povo, a libertação política. Este foi traído pelos próprios companheiros, perseguido e condenado a forca. Foi executado em 21 de abril de 1792. Partes do seu corpo foram expostas em postes na estrada que ligava o Rio de Janeiro a Minas Gerais, locais onde ele pregou suas idéias revolucionárias. 

Muito consideram Tiradentes o maior herói do Brasil, pois lutou contra a exploração dos antigos ratos saqueadores portugueses. Ele não suportou ver seu povo sendo escravizado por um governo que pensava somente em sua própria sobrevivência. Há muitas palavras postas na boca de Tiradentes em seus últimos instantes de vida, tal como "se dez vidas eu tivesse, dez vidas eu daria ao Brasil"; opto pela frase mais aceita entre os historiadores: cumpri minha palavra, morro pela liberdade.


Para refletir:

* Pra dilatarmos a alma temos que nos desfazer. Para nos tornarmos imortais a gente tem que aprender a morrer com tudo aquilo que fomos e com tudo aquilo que somos nós. 
(O Mérito e o Monstro, Fernando Anitelli - O Teatro Mágico)

* Toda vez que falta luz o invisível nos salta aos olhos. 
(Piano Bar, Humberto Gessinger - Engenheiros do Hawaii)


Deixo a hermenêutica com vocês.

11 comentários:

  1. Numa cultura local estilo "maionese da vovó" com "educapoliticlerical" com fundamentos "greco-romanicamente judaico" tem que ser humanamente divino ou divinamente humano pra ser um libertador. A melhor opção foi(é)(será) ser um soteropolitano marginal.

    Bons artigos.

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  2. Eu não diria que é necessário ser "divinamente humano" ou "humanamente divino" para morrer pela liberdade de alguém. Aqui temos dois conceitos a serem pensados: morte e liberdade.

    Morte neste caso é um conceito abstrato, e não concreto. É abstrato porque morrer significa se despir de seus interesses, deixando-os de lado pelo tempo necessário, e colocando no centro os interesses do(s) outro(s), é a doação em favor de alguém. É o óbvio lulante dizer que pela nossa política atual ninguém que, não infringindo as leis, defenda um ideal será condenado à morte.

    E por fim temos a conceituação de liberdade. Como eu já disse em outros posts, não acredito em liberdade, acredito em escolhas de prisões diferentes. Estamos sempre presos a alguma coisa, quer seja cumprir a missão de morrer na cruz, seguir os ensinamentos de alguém ou ir contra os dogmas. Liberdade para mim é isto, sou livre para escolher uma prisão diferente.

    A questão é: a que estamos dispostos a nos despir?

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  3. Este comentário foi removido pelo autor.

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  4. Interessante...os três exemplos citados no artigo resultaram na "evolução do martírio", coisa que talvez não se precise, mas resultaram...

    Ser "divinamente humano" ou "humanamente divino" não é dádiva exclusiva de nenhuma "profissão de fé", mas entendo como fusão da espiritualidade com humanidade.

    O "pai de santo" e o "santo pai - padre" ambos podem ser humanamente divinos e isso é "coqueluche" dos nossos tempos - é possível e quase comum...agora, fantástico é o divinamente humano, que não se "celestiena".

    Esses morrem abstrato e concretamente, se preciso for, e sua morte rende humanidade.

    Se ter limites de "outros" ou "pessoais" é uma prisão, realmente somos presos em todo momento, e em todo momento transitamos em cárceres...presos a alguém ou algo ou a si mesmo...e se assim for, a questão é a quem se escravizar...

    abraço!

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  5. Primeiramente obrigado por ajudar na dinâmica deste blog. Esta é realmente a questão: a quem se escravizar?

    Eu, por exemplo, procuro sempre prisões menores, com fardos mais leves.

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  6. Gosto do além do óbvio e seu blog propõe isso...
    É estranho falar sobre "se correr o bicho pega se ficar o bicho come", ou seja, aprisionados "onde ou aonde quer" que estejamos com "o que ou com quem" estivermos...parece que isso não combina com o nosso âmago... sei que a espiritualidade judaica-cristã, nessa creio com ressalvas, é muito explícita - somos "prisioneiros" em Deus ou fora de Deus.

    Falando "no que creio" já gera um certo "aprisionamento" ao que não creio e possivelmente agregação de uns e segregação de outros nessa prisão.

    Mas ainda assim, pensar num "aprisionamento" ainda que seja com intuitos "protetivos" pelas limitações propostas ecoa mal para alma - a minha.

    Talvez a imagem que temos de "aprisionamento - servidão" seja ocidentalmente incorreta ou pesada demais...

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  7. O óbvio já era (risos), em muito deles "as idéias não correspondem aos fatos" (Cazuza)!

    Realmente soa triste à alma dizer que estamos sempre aprisionados a algo. Talvez porque sua natureza seja livre, como diria Sócrates.

    Mas a única certeza enquanto estamos neste plano físico é que esta é sua triste realidade.

    Quanto ao metafísico, bem, deste "eu sei que nada sei". (e dá-lhe Sócrates novamente!) kkk

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  8. Ultimamente, o que me apresentam como razão soa-me como um grande sofisma.

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  9. Pensar nessa dicotomia ou tricotomia greco-cristã que nos departamentaliza no agora ou no amanhã também não apazigua minha alma louca.
    Gosto do "integralismo" do agora e sempre.
    Gosto dos Olam´s (universos recriados) sempre com o novo, mas isso foge minha futilidade, é um suposto existente que me complexa, então, observo de "canto de olho".
    Não acredito no sistema "LOSTico" de um eterno recomeço de Nietzsche respaldado no cíclico da história (eu vejo o futuro repetir o passado rs). Fora daqui seria melhor...
    Se fosse assim tudo se resumiria num certo: "Viver é sofrer e espero morrer esperando viver"

    Nesse sentido mórbido de esperança merece o que Nietzsche analisou - Deus está morto.

    Abraço Cazuzense (sem segundas intenções rs).

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  10. A liberdade terrena do corpo e da alma é uma utopia que me fascina. Se eu pudesse escolher entre vivê-la lá ou cá, escolheria cá, porque amo a vida e, por puro empirismo, é a única que tenho.

    Em resposta à triste realidade, todas as culturas até então tem a esperança de que, daquém desta vida, haja liberdade eterna assim como o próprio eterno.

    Talvez estas esperanças sejam respostas naturais às grandes questões da vida, que aliás nem fazem parte da vida (risos). Mas são questões da alma...

    E agora meus fantasmas: respostas às questões da alma não podem ser empíricas, científicas, devem ser espirituais...

    "Mas cada um no seu quadrado". Que os "espirituais" respondam à alma e os empíricos à realidade terrena. Sem que um ao outro considere inferior.

    "O jeito é viver um pouco de estoicismo, cinismo e epicurismo." (e dá-lhe Geziel)

    "o tempo não pára"

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  11. Tenho me apegado e sendo "pego" pela resposta a eternidade do hoje pelo mundo judaico, que o "cristianismo" "antisemitou"... questões da alma tão reais como do corpo e ambos fundidos, bem interessante...com tempo, peregrine nessa maldição.

    Enquanto isso limpamos nossas e vossas e alheias "piscinas cheias de rato".

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