"Para suportar a sua própria história, cada um acrescenta-lhe um pouco de lenda." (Marcel Jouhandeau)
Folclore brasileiro |
Os mitos fazem parte da história da humanidade e são representados por meio de manifestações arquetípicas no indivíduo, ou seja, eles são expressões do imaginário. Jung* diz que o mito permanece sempre um mito e ainda menciona que este tende a transformar-se no decorrer do tempo, quando deixa de ser um objeto de fé. Desta forma, o mito precisa ser recontado para que seja reavivado em uma nova interpretação. Logo, ao longo dos séculos, um mesmo mito pode, assim como reinterpretado, ser reformulado, perdendo sua forma original.
É através da introspecção que somos inseridos no mundo mítico, o qual nos faz entender melhor o cotidiano, pois não é uma idéia, mas dados instintivos, os quais são uma espécie de padrão de comportamento mental que faz parte da natureza humana. O mito faz parte da essência humana. O mito é parte da manifestação da criação e fantasia humana.
A partir daí conseguimos ter algumas percepções quanto a vivencia religiosa. Atualmente, as religiões com maior domínio mundial são as que sustentam seus mitos, reinterpretado-os e recriado-os há séculos. A maioria delas é datada de épocas anteriores a escrita. Assim sendo, a forma de sustentação de seus contos, lendas, fatos e outros tipos de eventos, acontecia através do discurso oral – o que sugere constante mudança, como em uma brincadeira do telefone sem fio ininterrupto há 2000 anos.
Moisés e as dez pragas no Egito |
As narrativas bíblicas, adotadas por cristãos e judeus, principalmente, passaram por este processo de forma mais acentuada antes da escrita e de forma mais branda após a escrita (através das variadas traduções). É claro que nelas a tradição oral modificou muitos de seus mitos – o que dá muito trabalho exegético aos teólogos mais estudiosos. Mesmo entrando na reprodução escrita (quando nem havia a imprensa de Gutenberg) os mitos ainda foram danificados. Além de reinterpretados, os mitos bíblicos (especialmente os do Antigo Testamento) sofriam modificações nas mãos dos copistas, os quais garantiam a preservação dos manuscritos. As condições físicas dos pergaminhos e papiros não eram das melhores, estes logo se corroíam, perdendo parte do texto, os quais muitas vezes se tornavam um quebra cabeça para os copistas, e nisto tudo ainda estou desconsiderando possíveis corrupções de copistas induzidos à mudanças nos textos copiados.
Mas estes textos chegaram até nós, os mitos chegaram até nós. Ainda que eles tenham sido reinterpretados e reinventados, como ainda o são, eles são importantes para nós, pois fazem parte da construção da fantasia humana. Como vimos no início, o mito está na essência humana, fazendo parte do processo de criação da psique.
O mito também nasce do conhecimento empírico individual, o qual está ligado a uma idéia preexistente (Kant). Portanto, não desprezemos os mitos religiosos, por mais absurdos que sejam. Aliás, quanto mais absurdos, mais dignos são os mitos, pois são esforços de uma mente criativa e fantasiosa, o que é bom para o homem. Se aliena, evolui também.
*A vida simbólica. Vol. XVIII/II. Petrópolis: Vozes.