Muitos morrendo pela liberdade de tantos...
Eu já estive bem mais próximo da data que se comemora hoje, a morte de Jesus de Nazaré, o deus cristão. Já estive nos púlpitos protestante e nos círculos de orações que interpelavam pelas almas que não compreendiam o real significado da morte do nazareno: a salvação. Eu ainda creio na salvação espiritual. Acredito que o espírito deve ser salvo "da prisão que tira sua liberdade". Esta liberdade é integral; ela é física, intelectual, espiritual e social. Ela inclui a plebe e a coroa, sãos e leprosos.
Sócrates antes de tomar chá de Cicuta, planta venenosa. |
Seguindo a uma ordem cronológica, neste dia minha mente é arremessada, primeiramente, há aproximadamente 2400 anos, onde em favor da liberdade da mente foi morto nosso Sócrates (platônico ou não). Aquele que andava pelas ruas de Atenas desviando os jovens - da ignorância para a sabedoria (esta era a subversão de Sócrates) - foi condenado à morte por envenenamento. Em uma sociedade manipuladora e de pensamento cativo, a mente de Sócrates tornou-se uma Caixa de Pandora. Aliás, em todas as épocas, ela sempre foi encontrada em coisas ou pessoas. Mas Sócrates não estava triste ante sua morte, para ele a morte era a libertação de uma doença chamada vida, portanto, à Asclépio, o deus da Medicina, devia-se um sacrifício. Enquanto todos choravam sobre seu leito, Sócrates, o obcecado pela libertação da alma através da filosofia, sempre irônico e maiêutico (concepção das idéias através da dúvida), dizia: devo um galo a Asclépio; pagai a minha dívida. Seus jovens, "cavalos de asas restauradas", estavam tristes , porém libertos. Viam pouco a pouco, gole a gole a morte daquele que os amara.
Segundo a tradição cristã, pouco mais de 400 anos depois de Sócrates estava morta a nova "Caixa de Pandora", Jesus de Nazaré, o anátema de religiosos e políticos. Este (cristão ou não) pode ser considerado o homem mais popular de todas as épocas. Também morreu pela liberdade. O sacrifício de Jesus, para mim, representa a libertação do espírito. Diz a Sacra Scriptura que o próprio Jesus defendia uma alma livre, não acorrentada e destinada à condenação eterna. Para Jesus esta liberdade era alcançada através do conhecimento da verdade. Segui-lo não era fácil, aqueles que o fizessem poderiam até terminar como ele, mas com certeza teriam menos fardos do que aqueles que escolheram viver aprisionados e não passaram pelo novo nascimento - a alma, antes morta, renasceria através da libertação do espírito, o conhecimento da verdade. Seu espírito era livre e, onde estivesse, haveria liberdade. Mesmo após sua morte, onde seus discípulos estivessem em seu nome, ali ele estaria e a salvação continuaria. Na história de Jesus a morte nunca foi uma vilã, apenas um meio para cumprimento de um fim maior. Em suas últimas palavras apenas a necessidade do corpo (água) e da alma (perdão), e, por fim, a legitimação de sua missão, tudo estava consumado.
Alguns dispensam a imagem de Tiradentes cabeludo e barbudo, pois ele era um ex militar e, em prisão, cortavam as barbas e cabelos dos presos para evitarem-se parasitas e doenças contagiosas. |
E não muito distante de nós e de uma realidade mais palpável a nós, está ele, Joaquim José da Silva Xavier, o famoso Tiradentes. Ex alferes ( militar que hoje corresponderia à primeira patente oficial das forças armadas) que lutou pela independência de seu povo, a libertação política. Este foi traído pelos próprios companheiros, perseguido e condenado a forca. Foi executado em 21 de abril de 1792. Partes do seu corpo foram expostas em postes na estrada que ligava o Rio de Janeiro a Minas Gerais, locais onde ele pregou suas idéias revolucionárias.
Muito consideram Tiradentes o maior herói do Brasil, pois lutou contra a exploração dos antigos ratos saqueadores portugueses. Ele não suportou ver seu povo sendo escravizado por um governo que pensava somente em sua própria sobrevivência. Há muitas palavras postas na boca de Tiradentes em seus últimos instantes de vida, tal como "se dez vidas eu tivesse, dez vidas eu daria ao Brasil"; opto pela frase mais aceita entre os historiadores: cumpri minha palavra, morro pela liberdade.
Para refletir:
* Pra dilatarmos a alma temos que nos desfazer. Para nos tornarmos imortais a gente tem que aprender a morrer com tudo aquilo que fomos e com tudo aquilo que somos nós.
(O Mérito e o Monstro, Fernando Anitelli - O Teatro Mágico)
* Toda vez que falta luz o invisível nos salta aos olhos.
(Piano Bar, Humberto Gessinger - Engenheiros do Hawaii)
Deixo a hermenêutica com vocês.