Analisar a Geração Z requer muita atenção. É preciso observar este recorte geracional como o menos homogêneo de todos, e o mais multifacetado até agora. Talvez por isso seja tão comum erros no marketing ou em reflexões sociológicas ao tratar a Gen Z.
Mas antes de continuarmos, para você que não está habituado com os recortes, veja as diferenças entre as gerações:
- Baby Boomers (1946-1964): marcados pelo otimismo do pós-guerra, valorizam a estabilidade, a qualidade e a tradição;
- Geração X (1965-1980): conhecidos pela independência, viveram a transição do analógico para o digital e valorizam a praticidade;
- Geração Y (Millennials, 1981-1996): os primeiros nativos digitais, valorizam experiências, buscam propósito e diálogo com as marcas;
- Geração Z (1997-2010): totalmente familiarizados com a tecnologia e o imediatismo, mas prezam pela autenticidade;
- Geração Alfa (2010-2024): crescem em um mundo interativo, influenciando as compras da família desde cedo;
- Geração Beta (a partir de 2025): a primeira que nascerá em um mundo de IA, moldando um novo perfil de consumidor.
Atualmente, boa parte da Geração Z está iniciando a vida profissional. Segundo um relatório da McKinsey, a Gen Z já representa cerca de 1/4 da força de trabalho global, um número que deve chegar a 1/3 até 2030.
Contexto histórico dos diferentes Zs
Para olhar de forma mais cuidadosa para a Gen Z, é útil dividi-la em dois subgrupos:
1. A primeira "leva" chamamos de Zillennials, entre 24 e 28 anos. Eles nasceram nos anos iniciais do Plano Real e do começo de uma estabilidade econômica no Brasil. À época, a pobreza e desigualdade social começavam a reduzir. Eles foram os primeiros adolescentes a terem o Enem como a porta de entrada para a universidade.
2. Os mais novos são os Zoomers, têm entre 16 e 23 anos. Eles se encontram em muitos pontos de intersecção: universidades e eventos sociais. Também compõem a maior parte da população "nem-nem" (jovens que não estudam, não trabalham e não buscam emprego).
Os Zoomers foram os que mais ficaram no fogo cruzado ideológico. Bem na fase de formação do pensamento crítico, tiveram que enfrentar, sem ferramentas, esquerda e direita vociferando suas teorias.
Apesar de também estar acontecendo entre os Zillennials, os Zoomers têm liderado uma revolução silenciosa de quebra paradigmas. Parecem ter fechado os ouvidos e olhos para o mundo à procura de autenticidade.
Eles não querem mais do mesmo. E isso tem se manifestado de forma intensa em algo que foi abandonado por muitos Zillennials, por Millennials e pela Geração Esquecida (X): a fé.
O fenômeno: Gen Z abraça o Catolicismo
De forma geral, a Geração Z tem chamado a atenção mundial: uma crescente adesão ao catolicismo. Os zoomers especialmente.
Longe de ser um movimento isolado no Brasil, é uma tendência observada na Europa e nos EUA, impulsionada por influenciadores digitais que criam memes, pregam e ensinam para os jovens.
Os dados são impressionantes. Na França, os batismos entre jovens de 18 a 25 anos, quadruplicaram nos últimos quatro anos, e a Páscoa de 2025 registrou um recorde de 17.800 batismos de adultos. Já nos EUA, um estudo de Harvard de 2023 encontrou mais americanos da Gen Z se identificando como católicos.
Uma análise multidisciplinar
Pensando nisso, como teólogo, cientista social e analista de marketing, estou me propondo a começar a analisar esse movimento de perto — por enquanto, de forma breve. Vejo que essa tendência nasce da confluência de anseios profundos desta geração, que busca respostas que o mundo secular e outras vertentes religiosas não têm oferecido.
Breve perspectiva Sociológica: a fuga da fragmentação
Enquanto os Zillennials amadureceram em um cenário de excesso de informações, os Zoomers sofrem com a profunda fragmentação ideológica dos últimos anos.
A hiperindividualização moderna gera ansiedade existencial para muitos deles. Há uma notável falta de pertencimento nessa geração.
A ausência de referências sólidas é uma constante. A filósofa Marilena Chauí aborda essa realidade. Em entrevista à Folha de S.Paulo, Chauí mencionou a influência do neoliberalismo na sociedade, um sistema que fragmenta a classe trabalhadora globalmente.
A mesma influência chegou ao pensamento ideológico dominante na política e educação, o qual estratificou "múltiplas personas" a serem defendidas pelo Estado e Sociedade.
Nesse cenário, um Zoomer é constantemente instigado a se encontrar e se manifestar em diversas identidades.
Sua sexualidade precisa ser defendida, sua etnicidade precisa ser respeitada e sua identidade de gênero protegida.
Sua classe social precisa ser representada e sua espiritualidade vivida de forma ancestral.
Ainda há os posicionamentos ambientais e outras discussões que realmente são urgentes, mas demandam uma maturidade intelectual complexa.
Em meio a essa avalanche de informações e escolhas, o catolicismo surge oferecendo uma comunidade global unificada e coesa. Apresentando uma tradição consistente e milenar (ancestral).
Com posicionamentos autênticos para o mundo contemporâneo e enraizados, a Igreja Católica fornece uma identidade coletiva forte e inabalável.
Isso atende a um profundo anseio por solidez e pertencimento: um porto seguro no oceano de incertezas.
Breve perspectiva Teológica: em busca de solidez e unidade
Muitos jovens da Gen Z passaram por um contexto protestante heterogêneo. São filhos do crescimento acelerado da igreja evangélica no Brasil na década de 2000.
Naquele período, a população evangélica passou de 15,4% em 2000 para aproximadamente 22,2% em 2010, superando o crescimento da população total.
Porém, como é da natureza do protestantismo, ele cresceu fragmentado. Não diferente, a saturação com a instabilidade doutrinária tem sido um fator decisivo para a busca pela solidez do catolicismo.
A crise do protestantismo conflitante
O debate protestante é desgastante. Duas igrejas sob um mesmo "guarda-chuva" (Presbiteriana, Batista e Assembleia) podem apresentar conflitos teológicos significativos:
- O batismo bíblico é por imersão ou aspersão?
- É aceitável batismo infantil ou somente o batismo de crentes professos?
- A perspectiva sobre o livre arbítrio é calvinista ou arminiana?
- Os dons espirituais ainda se manifestam ou cessaram com os apóstolos, como falar em línguas, profecias e curas?
- Qual a natureza da Santa Ceia? Ela é um símbolo memorial (visão de Zwingli), uma presença espiritual pela fé (visão de Calvino) ou em uma presença real "com, em e sob" os elementos (visão de Lutero)?
- Qual o papel das mulheres na liderança eclesiástica? Elas podem ser ordenadas como pastoras e presbíteras?
Boa parte dos evangélicos ainda precisa lidar com a governança instável e a ausência de uma autoridade institucional central forte como o Vaticano.
Também há a ausência de uma liturgia histórica. E o que dizer da busca incessante pela adaptação de pregações e músicas às transformações da sociedade?
Por fim, ainda temos a falta de símbolos de fé que permanecem vivos em outras religiões históricas, como judaísmo, islamismo, budismo e religiões de matrizes africanas.
A carência de artes no meio evangélico gera um vácuo espiritual, escancarando a falta de entendimento antropológico e arqueológico do tipo de animal o homem é: um ser de símbolos.
Essa fragmentação e pobreza simbólica tem feito com que a Gen Z redescubra o catolicismo, especialmente os Zoomers.
O paradoxo digital-tradicional: evangelização nas redes
No final de julho deste ano, o Papa Leão XIV recebeu influenciadores digitais no Vaticano — um aceno de reconhecimento da importância desses na missão evangelizadora.
O Papa Francisco já havia reconhecido o poder da internet, chamando-os de "missionários digitais".
Na última Quarta-feira de Cinzas, um evento curioso foi visto pela Europa: jovens e adolescentes exibiram as cinzas na testa por meio de suas redes sociais, demonstrando um orgulho crescente pela identidade católica, quebrando o constrangimento religioso tradicional.
Breve perspectiva em Comunicação: a estética
Mesmo um profissional júnior de marketing há de concordar: a estética católica é poderosa.
A comunicação da Igreja Católica é rica em símbolos históricos, arquitetura majestosa e rituais repletos de historicidade.
- Cruzes, rosários e imagens sacras que materializam toda a narrativa;
- Catedrais, basílicas e mosteiros que silenciam os dias atuais;
- A estética das missas que induzem à introspecção, respeito e ordem;
- As procissões e arte sacra geram respeito por onde passam.
Essa estética milenar cria um forte contraponto à superficialidade das redes.
E foi através de padres, diáconos e outros atores religiosos que elas entraram nos feeds. A autenticidade encontrou seu público-alvo.
Por que pensar em marketing?
Para quem trabalha com comunicação, entender esse paradigma em movimento é crucial, pois em breve essa geração será dominante no consumo.
A Gen Z anseia por autenticidade, profundidade e narrativas sólidas, com lastro histórico.
No meio de tanta técnica de persuasão, com sábios estrategistas de marcas inundando o LinkedIn com conteúdos, cursos de R$29,90 e imersões de R$ 10.000, talvez seja hora de olhar para uma simples e milenar:
- Autenticidade na performance;
- Valores sólidos em meio ao relativismo;
- Comunidade sobre personalização extrema;
- Storytelling envolvente sobre uma boa notícia que todos já conhecem.
O crescimento da adesão ao catolicismo pela Gen Z, especialmente os Zoomers, revela uma geração em busca de raízes, tradição e uma comunidade global.
Se o seu algoritmo ainda não te levou até lá, faça uma busca e veja como o "Silent Revival" não é nada silencioso nas redes sociais.
Ao que tudo indica, há uma revolução espiritual a caminho que transformará a sociedade e o mercado nos próximos 30 anos.
Por que tudo neste texto foi breve?
Porque teremos mais. Aguarde!
Obrigado por ler este post!
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