quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

A magia de quem volta (continua) a ser criança


Velhinhos são crianças nascidas faz tempo... (O Teatro Mágico)
(Depois reposto com imagens) 

Conheço velhos rancorosos. Estes trazem no olhar e nas mãos as profundas e duras marcas da vida. Não sorriem, zangam-se, esbravejam e dizem palavrões. Não são loucos, são conscientemente infelizes. São chatos que não conquistam o próprio neto, conquistam o desejo mórbido das noras e genros, dão medo, são bruxos. Reclamam da vida o tempo todo; de todas as suas décadas de injustiças. Desrespeitam o próprio corpo, correm, apressam-se em ir e voltar. Suas sentem e ressentem suas duras dores. Negam a todos a ternura que guardam para seus animais, e só, sozinhos. Não encontram cor na vida; ela é sombria, e ponto. Cospem no chão, na cara, no prato, na pia, na cama, na cova. São gastados pela vida, desgastados pela própria mente, desgostosos de si mesmos.

Do outro lado há as velhas crianças que se tornam mais crianças a cada dia. Para estas a dor é só um corte passageiro. Vivem a sorrir e cantar. Falam comigo e falam sozinhas. Caminham vagarosamente pelos jardins. Não têm pressa do tempo que ainda não veio. Não têm remorso do tempo que então  já se foi. Não tem gatos, tem gente que está sempre sorrindo, admiradas. A morte é um tormento somente da gente que rodeia esta gente sã.

Estas velhas crianças contam, sorrindo, as intempéries da vida; choram, sorrindo, ao lembrarem-se do momento que agora revivem: a doce infância. A morte não consegue lhes sinalizar a vinda nem mesmo nas tantas dores. A alegria lhes produz morfina. Suas histórias acalentam até os ouvidos mais apressados. Suas orações são conversas que nos fazem abrir os olhos e procurar uma terceira pessoa ao redor. Sua bênção tem cheiro e cor. Sua voz baixa nos faz aproximar os ouvidos, mas é um truque, elas querem que encostemo-nos nelas, são efetivas no afeto.

Sabe qual a única semelhança entre essas velhas pessoas velhas? Ambas se construíram ao longo da vida. Concluo que, de fato, quem não for como uma criança não ganhará um doce quando ficar velho, mas sentirá a morte mais amarga a cada dia. A Morte é doce, é o presente da vida!

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